quinta-feira, 7 de novembro de 2024

O desafio da vida no Cerrado Paulista e assédio moral na Unesp Campus de Rio Claro por vigilante

O Cerrado Paulista no município de Rio Claro pede socorro. E apenas pessoas corajosas conseguem, pela experiência da coragem, vivenciar a magnífica beleza da fauna e flora e, mais do que isto, analisar à luz das leis as áreas visitadas, sobretudo com seus problemas sociais e ambientais, criando conteúdo como, por exemplo, um artigo, livro ou simplesmente uma postagem de blog com fotografias. No caso do presente texto não haverá fotografias, pois decidi usar apenas as palavras para descrever, não tendo vontade de registrar nada além do meu depoimento. Eu sou pesquisador independente, embora atualmente seja bolsista da Capes, me apresento dessa maneira nos artigos que publico sozinho, e por causa disto sou livre para pesquisar e escrever sobre o que quiser, sem medo de ser boicotado por grupos ou panelinhas capazes de ferir egos acadêmicos ou interesses financeiros.

Nesta semana, depois de quase dois anos morando em Rio Claro, decidi seguir a estrada que, depois do Laboratório de Microbiologia da Unesp, leva à zona tampão (ou zona de amortecimento) da Floresta Estadual Edmundo Navarro de Andrade. Fui sozinho, da Unesp, em direção aos eucaliptos seguindo estradas de terra e me deparei com uma área muito rica de Cerrado, com espécies nativas que provavelmente sequer foram descobertas ainda, desconfiando fortemente que tal área se trata de um hot spot do Cerrado Paulista devido a preservação. O Cerrado é o bioma mais antigo do planeta Terra e sua florescência se dá na maior parte das vezes por meio de estruturas chamadas de “xilopódios”, órgãos subterrâneos que conseguem brotar depois de queimadas. Removendo os xilopódios certamente nunca mais haverá brotamentos.

Ocorre que tal área, com cerca, e provavelmente não pertencente à Universidade, principalmente porque as pessoas evitam a região com medo de assalto ou violência, está se fragmentando por causa de retirada da vegetação nativa. Para entender os danos causados pela fragmentação da paisagem, sob minha perspectiva, sugiro ler o artigo que publiquei em co-autoria com Frederico Yuri Hanai, da UFSCar e Marcelo Concário, da Unesp Bauru, intitulado “Análise da fragmentação da paisagem na região de Bom Repouso” disponível online e impresso na Revista Geografia de Rio Claro. A publicação é de 2008, mas o tema continua atual. Depois dessa publicação passei a realizar um belo trabalho iconográfico do Cerrado Paulista situado em São Carlos, onde fiz mestrado, na companhia da pesquisadora Janete Brigante e as fotografias estão com ela, pois foi uma das que opinou na época no projeto da Lei do Cerrado durante a consulta pública.

Eu puxei conversa com alguns trabalhadores que estavam lá quando fui explorar a área para fotografar e descobri, segundo informações de 5 trabalhadores, que irão retirar a vegetação nativa para instalar uma usina fotovoltaica. Usando o território da Unesp para adentrar a zona de amortecimento da FEENA, que almeja ser uma universidade sustentável, a exemplo da Universidade de São Paulo, estão as atividades a pleno vapor, com abertura de valas gigantescas e remoção de terra para, na mais sublime e triste cegueira, enterrar o Cerrado Paulista e desta forma ninguém ver o crime ambiental que estão cometendo diariamente por lá. Foi assim que o cerrado morreu em vários lugares que conheço, dentre estes o cerrado de Brotas, estudo de caso de meu mestrado na USP. Soterrando. Enterrando. Segundo informações dos funcionários da empresa privada, duas que consultei, sendo uma a Master Engenharia com sede em Rio Claro e a outra com sede em São Paulo, cujo nome não me lembro agora, a partir da semana que vão já vão fazer a “limpeza” do lugar usando correntes e tratores. É inadmissível que depois de mais de uma década da implementação da Lei 13.550 de 02 de junho de 2009, também conhecida como Lei do Cerrado, isto ainda ocorra no estado de São Paulo, tido como o mais avançado no quesito “leis ambientais”. É muito descaso, sobretudo porque há na Unesp Campus de Rio Claro cursos de Biologia e Engenharia Ambiental, além da Geografia (minha área), supostamente formadores de líderes e ambientalistas, e, pesquisando por algumas palavras-chave nos buscadores como Scholar Google, não há muitos trabalhos científicos sobre o “quintal de casa” feito pelos que passam a maior parte do tempo dentro de suas salas. Tenho a impressão de que funcionários (professores principalmente) e alunos só se interessam por estudar áreas que já possuem bastante referência a respeito. Uma unidade de conservação do calibre da Floresta Estadual Edmundo Navarro de Andrade necessita, incluindo aí a zona de amortecimento, explorar mais a área sob o viés da ciência de maneira sistêmica e não isolada, para garantir que o patrimônio natural (chamar o Cerrado Paulista de patrimônio natural não é falácia para quem conhece sua potencialidade para inclusive criar medicamentos para doenças até então sem cura) chegue às mãos das gerações futuras e, também, às nossas. Eu não quero nem preciso de torcidas para me acompanhar nem aqui nem em lugar nenhum. E por isto valorizo ainda mais a minha liberdade! Minha liberdade de ir e vir em tempos de paz para onde eu quiser no Brasil. Minha intenção era também acompanhar todo o curso do córrego que passa ao lado da Unesp registrando o que achar interessante.

Da nascente até a região da Unesp o desafio da vida ainda se faz presente, principalmente porque o aspecto social não pude deixar de observar. É um risco, devemos assumir, mas com cuidado tudo dá certo no levantamento ou criação de dados. Mesmo com medo de gente desconhecida que habita a bacia hidrográfica, fui em direção ao que pretendia levantar, como pesquisador independente em Rio Claro, e notei a presença de muita gente usando crack com seus cachimbos feitos de várias maneiras e um cheiro horroroso que tive vontade de vomitar quando senti, chegando inclusive a conversar com alguns deles, mas perdendo contato com todos depois. Isto é um problema sério de saúde pública e os anjos na Terra que são responsáveis por contribuir para um mundo melhor, deveriam ir lá em busca de viciados e doente para se tratarem, seguindo o exemplo da irmã Dulce, que em Salvador ia atrás de pessoas que necessitavam de auxílio e os curavam, ou os davam uma boa morte. Me disseram que a polícia nunca entra lá, mas nunca é muito tempo, pois é território de traficantes que escondem e comercializam suas drogas na margem direita do córrego. E eu ao ver os barracos achei que se tratava de um acampamento dos Sem-Terra ou moradia de mendigos, mas logo disseram que se trata da “boca” do bairro. É problemático isto? Sim! Vou resolver o problema de Rio Claro? Não! Definitivamente não, pois nem é meu tema de interesse maior isto, apesar do que, encaminharei este texto para a política ambiental e até para a Unesco, cujo órgão tenho interagido em parceria com minha pesquisa em Paraty, e que recentemente concedeu o título de Cidade Árvore do Mundo a Rio Claro. É mesmo? Destruindo o Cerrado? Ah, vamos lá... Ainda não terminei. Falta pouco para meu texto ficar eternamente publicado aqui e você chegar a outros pontos mais sombrios.

Ao retornar para casa, passando por dentro da Unesp, fui abordado por um segurança mal-educado chamado “Brito”, que me pediu o RG e eu só estava com a carteirinha da Unesp, sem foto. Foi o que a Unesp conseguiu me dar (deveriam fornecer cartão de identificação com foto para os alunos, como fazem outras boas universidades, mas querem economizar para gastar sabe lá Deus com o que. Tem que gastar o dinheiro público sim, mas em benefício de toda a comunidade). Que tal a sugestão?

O segurança Brito queria me levar para a portaria da praça próxima à igreja de Santa Luzia e me expulsar da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", pelo que entendi na abordagem, mas logo adentrei uma sala de aula no Instituto de Biociências e falei sobre minha descoberta (que existe a ameaça real de derrubada do Cerrado Paulista próximo da Unesp com correntes e tratores na semana que vem), deixando claro também que minha identidade está muito mais no meu conhecimento do que num papel imundo, caso de meu atual RG, e que não tenho o hábito de usar para me locomover próximo de onde eu moro. Aprendi como lição a andar com documento oficial com foto. Um segurança despreparado abordar um pesquisador com 15 anos de Universidade de São Paulo porque estava sozinho caminhando num local ermo com Sol a pino é muito deselegante, mas marcante também, pois bastava um palavra para mandá-lo aprender a conviver com gente que tem mais capacidade e formação intelectual do que ele. Para mim foi tenso, mas fiz minha parte por pura diversão e contentamento, pois às vezes eu preciso mesmo pisar na grama, sentir os cheiros do cerrado, observar a vida plena na natureza e talvez, enfim, incorporar Pina Bausch e dançar no deserto, pois aprendi diversas coreografias com pessoas que a conheceram pessoalmente e danço mesmo, na chuva, e quero me molhar. Quem vê de longe pode achar que é um louco, mas não, querido leitor. É ARTE. ARTE ELUCIDA. Paraty (meu estudo de caso no doutorado) também é uma das mais violentas, mas do estado do Rio de Janeiro. O meu tema precisa ainda estar bem delimitado, pois não quero colocar minha integridade física em jogo durante os trabalhos de campo que ainda terei que fazer por lá. Inclusive pretendo escrever um artigo científico sobre o condomínio Laranjeiras, onde habitam bilionários que impedem o acesso da população à praia. Há muita confusão ainda sobre o bem público e privado, bem como suas diferenças na prática.

A título de curiosidade, Rio Claro, em matéria publicada pelo Jornal Cidade em junho deste ano, é a terceira mais violenta do estado de São Paulo. Historicamente o horto florestal e sua posterior transformação em unidade de conservação é marcado por casos assombrosos de assassinatos e violência das mais variadas formas, sendo o mais conhecido o maníaco da bicicleta que assassinou mais de 100 pessoas e muitas dessas enterrou na área tratada neste texto. No horto florestal, “médiuns” (eu sou espírita Kardecista de formação) como eu sentem imediatamente a energia pesada, apesar da beleza do verde! E saber dessas histórias faz com que eu imediatamente perca o encanto pela beleza do patrimônio natural. Foi fácil chegar às informações sobre a violência em Rio Claro, que só descobri depois que cheguei em casa depois dessa aventura que vos conto e passei a pesquisar na Internet. Se tivesse chegado às matérias que li antes, como as que aqui cito, não teria ido fazer reconhecimento de área para estudar porque realmente a violência é gritante e escancarada. A última frase que me lembro do vigilante foi: "hoje você foi longe demais". Além de triste, é assombrosa a violência. Eu pesquisei pelas palavras-chave “violência + horto Rio Claro”, “violência + Rio Claro”, “violência + Unesp Rio Claro”, aparecendo diversas reportagens sobre os casos ocorridos, algumas bem recentes. Noutra matéria descobri que um esqueleto humano foi encontrado pendurado numa árvore no meio da vegetação nativa próxima ao horto. Se vocês seguirem em direção ao horto florestal pela estrada que passa pelo Laboratório de Microbiologia da Unesp, encontrarão uma entrada na frente sem porteira, as duas valas gigantes... Virando à esquerda uma pequena estrada dá acesso a um local com um cavalete de madeira gigantesco improvisado e uma caixa de madeira de supermercado, daquelas que guardam frutos, que parecia ser um banco para observação do cavalete. Mais a frente há um monte de terra e árvores mortas soterradas. O cheiro de carne putrefada estava muito grande anteontem quando estive por lá, havia uns urubus e muita mosca varejeira. Imaginei um pintor ali, mas a coisa pode ser mais séria do que eu presenciem in loco. Estou ligando possíveis fatos a partir da análise da paisagem. Talvez seja mais um corpo humano jogado por lá em decomposição e recomendo que autoridades adentrem a área para investigar se é gente ou bicho morto. Na estrada do lado direito da mesma área é onde se avista o paraíso na Terra. O Cerrado Paulista está belíssimo, repleto de flores maravilhosas depois das chuvas que caíram nesta semana, com suas texturas incríveis e aveludadas, meu Deus, obrigado por ter me trazido para Rio Claro! Há 7 anos eu compartilhei uma fotografia publicada pelo jornal da Unesp no Facebook dizendo que o cenário parecia um filme de terror (e ainda é!) e quem diria que assim que cheguei aqui no ano passado a atualização apareceria no Facebook. 7 anos!!! Seria destino? Missão? Talvez, ainda não sei. Que me ajudem os exotéricos na resposta. Mas eu quero, mais uma vez, ir embora. Para onde ainda não sei, mas quero, pois preciso de paz para sobreviver e violência ou sensação de insegurança me deixa paralisado. Sugiro pensar na ideia de usar instalações ecoturísticas na área de Cerrado próxima da Unesp, com placas interpretativas e voltadas à Educação Ambiental, em vez de usina fotovoltaica, e, também, câmeras de monitoramento eficazes em pontos estratégicos para monitoramento. Além é claro, de uma guarita, já que se pretende identificar quem é ou não da "comunidade unespiana", sem segregação ou expulsão de quem quer que seja. Chegando ao fim, fica aqui minha postagem-denúncia, sendo encaminhada para a administração de diversos órgãos ambientais e da Unesp em Rio Claro, também meu repúdio pelo assédio moral que experimentei pela primeira vez aqui pelo funcionário (formalizei reclamação e enviei até para a atual reitora que, com toda minha humildade, com certeza trará muita melhoria para nosso campus), não fazendo, desde que enfrentei usineiros de cana-de-açúcar em Araraquara e Brotas há uma década, NENHUMA CONCESSÃO.

CÓPIA DO E-MAIL ENVIADO PARA A REITORA DA UNESP E PARA O SETOR DE VIGILÂNCIA DA UNESP 

Prezado Maurício,

Tudo bem? Espero que esteja ótimo. Entro em contato para registrar uma abordagem agressiva de um dos seguranças da UNESP campus de Rio Claro, onde sou pesquisador bolsista de doutorado (o terceiro que faço), ontem próximo à zona de amortecimento da floresta estadual, seguindo a estrada do Laboratório de Microbiologia. Detestei a forma como fui tratado. Eu estava fazendo pesquisa independente, coisa que quase ninguém faz porque se acostuma, como funcionários, a só chupar crachá e receber salário. Em outras palavras, não fazem muito a diferença no mundo. Eu tento fazer com meus métodos sempre ligados à educação ambiental e é o que estava fazendo no momento da abordagem. Informo que, segundo informações de trabalhadores, funcionários de uma usina fotovoltaica que estavam trabalhando lá me informaram que vão derrubar a vegetação nativa na semana que vem usando correntes e tratores, devendo ser enterrada em duas valas gigantes já abertas para instalação da usina. Você deve conhecer a área melhor do que eu. Pediram segredo, pesquisei e não encontrei nenhum estudo de impacto ambiental e acho que levarei a pauta para a reitoria, já que a Unesp pretende também ser uma universidade sustentável como é a USP. Para isto deverá usar indicadores de desenvolvimento sustentável queira ou não http://each.usp.br/turismo/publicacoesdeturismo/ref.php?id=1480 e isto envolve a educação e diplomacia de todos, inclusive de funcionários. Um segurança que se identificou como Brito me abordou primeiro com um carro, pediu documento e eu apresentei. 10 minutos depois o mesmo segurança apareceu com uma moto quando eu já estava indo embora, me obrigando a sair da Unesp pela portaria principal porque me viu com roupa diferente da que havia visto no primeiro encontro, enquanto estava no carro, não aceitando minha identificação e não me deixando chegar ao departamento onde atuo, pois não aceitou minha identificação estudantil e me perseguiu quase a ponto de eu acabar com a psiquê dele usando apenas palavras, pois fiquei acuado. Isso que aconteceu comigo é ASSÉDIO MORAL e como a reitora me seguia no Instagram, falarei com ela também, enviando cópia deste e-mail. O primeiro item do site da vigilância da Unesp diz que ao ser abordado por um funcionário da vigilância basta apresentar tal identificação https://igce.rc.unesp.br/#!/manual-academico/administracao5764/setor-de-vigilancia/. Ora, se não vale a identificação estudantil que a Universidade fornece aos pós-graduandos, por que não passa a fornecer alguma então que sirva? O direito de ir e vir em tempos de paz é para mim sagrado, ainda mais nas universidades públicas do Brasil, celeiro de ambientalistas e líderes. Era meio-dia e a universidade estava aberta. Deve estar sempre aberta a todos que dela precisem ou queiram vivenciar. Funcionário não está numa hierarquia maior do que alunos, lamento informar. Um aluno pode fazer muito mais pela Universidade do que trabalhadores alienados. Isso mesmo: o funcionário que deve ficar tonto de tanto rodar de moto e carro procurando uma presa fácil para alimentar seu ego, expulsando do território da Unesp, tão falada ultimamente que num ranking que diz ser a melhor universidade jovem do Brasil, é típico exemplo de alienação. A Universidade pública é para acesso e uso de todos, sem distinção. Estou errado, professora Maysa? 

Todas as vezes que eu for visitar a área de agora em diante, vai demorar um pouco, seguirei a recomendação da vigilância do campus, também num dos itens do link acima, para me acompanhar, pois ainda acho, embora não seja meu tema de pesquisa principal, que publicarei bons trabalhos capazes de despertar o interesse sobre o Cerrado Paulista, protegido por lei estadual. 

Gostaria de lhe perguntar se devo imprimir duas vias assinadas sobre a abordagem agressiva do funcionário Brito e protocolar em algum órgão da Unesp, ou se é suficiente este e-mail para que o setor responsável converse com ele para que isto não mais aconteça com ninguém nem comigo? Afinal, a Unesp é pública, entra e sai dela quem quer, ou deveria, e como não é a roupa que faz o monge, eu sigo fazendo meu trabalho na esperança de contribuir para o bem coletivo. Por favor, Maurício, diga isto ao Brito se o encontrar. Ele fotografou minha identificação estudantil e é bom que saiba quem sou. É bom que ele saiba que não é a roupa que faz o monge! Passível de interpelação judicial, o assédio moral é inadmissível! Ainda mais por um segurança estúpido. Tenho um blog com milhões de acessos e dependendo de sua resposta, por favor, me oriente como melhor proceder, publicarei lá uma nota. Também incentivarei estudantes de graduação a estudar a área com iniciação científica. Numa busca no Google sobre “violência + horto” cheguei à informação de que muita gente já foi assassinada e enterrada na região da floresta, não sei se você sabe (i.e “maníaco da bicicleta”). Fiquei com medo, mas ainda bem que só descobri os horrores de Rio Claro e do horto depois que fui e já me dou por satisfeito com os campos informais que fiz.

Fico por aqui, pedindo também que informe ao funcionário que sinto muito pela forma como eu também tratei ele na frente de todo mundo no IB, e que peço desculpas. O fiz daquela forma porque ele não soube se comunicar comigo. Certamente não o verei nunca mais na vida. Espero. Eu precisei mandar ele estudar e chegar, apesar da idade avançada, no nível de consciência que estou e que pretendo chegar! 

Ficarei feliz se obtiver um retorno deste e-mail. 

Atenciosamente,


JOVINIANO NETTO. 

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Sem título

Sinto-me honrado e feliz com a declaração pública nas redes sociais que recebi do Embaixador das Artes e da Cultura da Academia de Letras do Brasil/Suíça, e artista plástico baiano mundialmente reconhecido Ed Ribeiro.



terça-feira, 24 de outubro de 2023

A Geografia dos Alimentos no norte do Paraná: influências estrangeiras

 Resumo

Desde sua fundação, Londrina foi colonizada por muitas etnias, fazendo com que os hábitos alimentares de seus habitantes fossem se tornando bastante diversificados. Sua cultura alimentar foi moldada inicialmente a partir dos recursos nativos disponíveis e plantados, bem como dos produtos vendidos em lojas de “secos e molhados”. A evolução dos processos que fizeram Londrina tornar-se um centro gastronômico passou por várias etapas, sendo evidentes as contribuições dos árabes e japoneses. Expor essas influências é o objetivo central do presente trabalho.

Palavras-chave: Geografia da Alimentação; restaurantes; árabes; japoneses.

 

Abstract

 

Introdução

Sabe-se que a região onde se encontra Londrina, há cerca de setenta anos, havia uma rica e densa floresta tropical latifoliada, constituindo-se então nessa época num proveitoso negócio imobiliário realizado principalmente pela Companhia de Terras do Norte do Paraná, empresa de origem inglesa – Paraná Plantation Co. – mais tarde substituída por um grupo de negociantes paulistas (MOMBEIG, 1957. pp.116/122), contribuindo para o início de uma aglomeração que necessitava suprir suas necessidades alimentares diárias para transformar a paisagem e o meio até então inexplorado, ou pouco explorado.

Muito se tem conhecimento sobre esse processo de povoamento da região, mas embora nos museus e demais centros de pesquisa de Londrina haja vasto material bibliográfico e iconográfico sobre este processo, pouco se sabe sobre a dinâmica dos hábitos alimentares e sobre o quanto as cerca de trinta e duas etnias influenciaram para o que se percebe hoje na cidade: uma considerável quantidade de restaurantes típicos que coincidente ou não, alguns dos mais tradicionais foram fundados à época da colonização e urbanização de Londrina.

Na medida em que a mata era desbravada, eram encontradas matérias-primas que poderiam ser utilizadas como alimentos. É o caso do palmito e dos porcos selvagens, os catetos. Mas como vieram pessoas de várias regiões brasileiras e de outros países (neste caso, muitas vezes vindas de outros Estados numa segunda tentativa de “fazer a América”) com hábitos diferentes das populações tradicionais (índios e demais habitantes), viam-se obrigadas a suprir suas necessidades alimentares tendo que comprar produtos nas vendas e empórios da cidade – as chamadas “lojas de secos e molhados”, sem no entanto, deixar de aproveitar as iguarias que a mata dispunha, especialmente na ausência dos ingredientes habituais (AYRES, 2005; BISOGNIN, 2005; BRUGIN, 2005; SCHWARTZ, 2005).

O projeto teve como objetivos gerais a caracterização e contextualização dos hábitos alimentares da população de Londrina, buscando como objetivo específico, a sistematização dos dados obtidos. Pela amplitude no campo de pesquisa nessa área ainda pouco explorada na região, optou-se em analisar com mais detalhes os hábitos e influências alimentares dos árabes e dos japoneses que vivem em Londrina e acompanharam a evolução da cidade, buscando dessa forma uma maior especificação do tema tratado.

 

Considerações sobre a alimentação humana através dos tempos

 

A influência de diversos fatores físicos ou geográficos faz-se sentir na pesquisa da história da alimentação de grupos humanos em todo o mundo. A época em que o homem teve origem, bem como as etapas de sua evolução têm sido investigadas por diferentes campos do saber. Um exemplo é a paleontologia que por meio da análise de fósseis evidencia uma evolução gradativa de experiências em que se fundamentam nossos conhecimentos e muitas preferências alimentares (ORNELLAS, 2003).

Sabe-se que a alimentação do homem tem se baseado em um conjunto de espécies vegetais e animais e em técnicas de cultivo e culinárias. Esse conjunto representa o ponto de equilíbrio entre os recursos disponíveis, a capacidade produtiva do ambiente e o nível de desenvolvimento cultural e tecnológico num dado momento (KHATOUNIAN, 1994).

No decorrer dos diversos períodos da evolução humana, foram desenvolvidas técnicas especializadas a partir da fabricação de utensílios de pedra, de metal e também, no aprimoramento das maneiras de transformar os alimentos. Quando o homem deixou a vida nômade para viver em pequenas aldeias, aprendeu a domesticar animais, a cultivar plantas e a preparar seu próprio alimento, iniciando-se então na vida pastoril e cultivando a terra. Dispunha de carne, leite – de onde obtinha manteiga, coalhada e queijos – e de lã (obtida por meio da criação de ovelhas) para tecer agasalhos e, possuindo uma maneira de assegurar-lhe o sustento através da vida sedentária passou a desenvolver o dom artístico, como mostram com grande maestria, desenhos encontrados em cavernas calcáreas em várias partes do Planeta. O desenvolvimento da inteligência proporcionou ao homo faber a criação de artesanatos e com isso, novas formas de guardar e conservar os alimentos. Moldando barro e endurecendo-o na brasa, foram feitos vasilhames que serviam para cozinhar leguminosas e cereais, fazendo papas e iniciando-se na culinária. A farinha surgiu a partir da trituração – entre duas pedras – dos grãos que, misturados com outros ingredientes deram origem ao pão (ORNELLAS, 2003).

A partir dessa e de outras tantas evoluções ocorridas, as sociedades das mais variadas partes do Globo desenvolveram culinárias próprias levando-se em conta os recursos disponíveis no ambiente e aqueles introduzidos, sendo muitas vezes, identificadas fortemente pela história dos pratos locais e regionais ou, como no caso de alguns grandes centros urbanos, pela concentração de restaurantes típicos que buscam representar as culturas de várias localidades.

O Brasil e sua rica história alimentar

Na maior parte do território brasileiro, a mandioca era a base alimentar dos nativos, tornando-se também o prato diário dos novos habitantes que estabeleceram os primeiros núcleos afro-europeus de povoamento no País. A razão dessa supremacia pode ser verificada numa carta datada de 17 de outubro de 1781, enviada por José da Silva Lisboa, mais tarde Barão de Visconde de Cairu, a Domingos Vandelli, professor da Universidade de Coimbra (apud AGUIAR, 1982, p.64): 

[...] cada preto sem dificuldade prepara e planta todos os dias 100 covas de mandioca, qualquer terra a mais medíocre produz 20 alqueires por mil covas. Dois pretos que trabalhassem juntos teriam feito em 10 dias planta para 40 alqueires; em outros 10 dias teriam colhido e preparado a farinha com o trabalho reunido. El-Rei dá aos seus soldados uma quarta de farinha cada 10 dias; desse modo os ditos pretos consumiriam por ano 20 alqueires e lhes restava ainda outros 20 para venderem, tudo fruto do trabalho de 20 dias. Não é fácil achar país, onde com 20 dias de trabalho, se tenha pão para todo o ano, e ainda alguma coisa de mais.

As primeiras tentativas de adaptar alimentos europeus tiveram seu desempenho ligado às condições climáticas e edáficas. Embora atacado pela ferrugem, o trigo foi plantado no Brasil. Anchieta menciona belos trigais no planalto de Piratininga. Três séculos mais tarde, Saint-Hilaire (apud TEIXEIRA, 1958 p.27-28) se referia a uma propriedade visitada em Minas Gerais da seguinte maneira: “... o agricultor cultivava ao mesmo tempo milho, feijão, cana-de-açúcar, café, algodão, mamona e trigo.” Dessa forma, a pouca importância do trigo na alimentação dos brasileiros ao longo da história provavelmente se deva mais ao melhor desempenho biológico de outras culturas do que à impossibilidade de produzi-lo.

Durante o ciclo da mineração, especialmente na região das Minas Gerais, a mandioca foi perdendo terreno para o milho. A concentração do trabalho na lavra do ouro obrigava a aquisição de alimentos produzidos à distância, transportados em condições precárias pelas tropas de mulas. A farinha de mandioca, mais suscetível à deterioração que os grãos de milho foi, por esse motivo, gradativamente substituída pelo angu de fubá e pela farinha de milho. Pela mesma razão, o feijão, de importância secundária no nordeste açucareiro, começou a se tornar mais presente. Vários viajantes descreveram nessa época a alimentação dos tropeiros, cujos elementos básicos (milho, feijão e toucinho) deram o matiz da mesa da vasta região do Brasil dinamizada pelo tropeirismo, do Rio Grande do Sul às Minas Gerais (KHATOUNIAN, 1994).

Durante o período colonial o arroz, trazido da Índia pelos portugueses, era escasso e seu consumo restringia-se a ocasiões especiais. O cultivo dessa cultura era mais exigente em trabalho do que o da mandioca ou o binômio milho-feijão, e foi implantado lentamente. Acredita-se que o que tem contribuído para sua expansão foi a vinda da família real para o Brasil, inaugurando um novo modo de consumo. Também deve ter sido relevante a sua tolerância à acidez e baixa fertilidade dos solos. Os roçados próximos das cidades produziam boas safras de arroz mesmo após exaurida a fertilidade natural da mata pelo cultivo incorporado ao cotidiano de boa parte do Brasil, formando com o milho, o feijão e a mandioca, a base alimentar do país (KHATOUNIAN, 1994), sendo que esses quatro produtos não participam com igual intensidade na alimentação das diferentes regiões do país.

No estudo da alimentação das populações brasileiras são comprovadas diferenças acentuadas e fundamentais, levando-se em conta os hábitos alimentares das classes abastadas e das classes pobres, bem como a alimentação de diversas áreas e regiões do país. Do ponto de vista geográfico-cultural, o Brasil pode ser dividido em algumas regiões alimentares elaboradas por estudiosos, dentre as quais se destacam as de Alfredo Antônio de Andrade, Josué de Castro, Rui Coutinho, A. J. de Sampaio, e Sálvio de Mendonça.

Por tratar exclusivamente dos aspectos culturais, optou-se no presente trabalho expor resumidamente a divisão proposta por Sampaio (1944), buscando dividir o Brasil em regiões naturais; zonas de simples aclimatação; e zonas agrícolas (apud SILVA, 1964) descritas a seguir. Pode-se observar nas classificações a estreita vinculação entre os recursos naturais e a base alimentar das regiões.

 

Regiões naturais – Alimentos autóctones

 

·                   Região da castanha, peixes, quelônios, frutas silvestres: Amazônia;

·                   Região do babaçu: Piauí, Maranhão, norte de Goiás e nordeste de Rondônia;

·                   Região do pequi: sertões semi-secos de Minas Gerais;

·                   Região do pinhão e do mate: Paraná, Santa Catarina;

·                   Regiões das pescas marítima, fluvial e lacustre, como fonte principal ou única: litoral e interior, exceto a Amazônia;

·                   Regiões de salinas: Cabo Frio, Mossoró;

·                   Regiões pouco providas ou desprovidas: zonas de mineração, campos gerais, campinas secas do Nordeste, região de sal de barreiro.

 

Zonas de simples aclimatação: rústica

 

Zona de carne e leite de cabra: sertões nordestinos (em vias de transformação graças a criação de açudes, poços e irrigação);

Zonas litorâneas do coco e respectivas fazendas: de Abrolhos ao Maranhão e uma disjunção ao sul;

 Zona do dendê: algumas localidades da Bahia.


Zonas agrícolas

 

Zonas do churrasco: Rio Branco, Marajó, Pantanal, Goiás e Rio Grande do Sul;

 Zonas da carne de porco, toucinho, fubá, leite e feijão: Minas Gerais;

Zonas de leite (de produção em larga escala): Minas Gerais;

Zonas de café: Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo;

Zona do açúcar: São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Sergipe, Alagoas e Pernambuco;

Zona do cacau: sul da Bahia;

Zona de cereais: arroz, feijão, milho, trigo etc. e numerosas disjunções;

Zona de laranjais: Limeira, SP, Rio de Janeiro, Bahia etc.;

Zonas frutíferas mistas: São Paulo (regiões de altitudes);

Zonas de bananais: Santos, Rio de Janeiro;

Zonas vinícolas: Estados do Sul e altitudes.


Breve histórico da influência estrangeira em Londrina

 

A grande influência de diferentes culturas que colonizaram a região de Londrina é um dos pilares no qual a Geografia da Alimentação neste trabalho se baseia. A historiografia londrinense da alimentação é muito pobre, e por meio de entrevistas com pessoas que vivem na região e acompanharam as principais mudanças em seu desenvolvimento podemos preencher a lacuna sobre a alimentação dos “pés-vermelhos” na época em estudo. Um artigo recente vem tratando do assunto reunindo os elementos básicos para a estruturação desse perfil (CARVALHO, 2005-a).

Há cerca de setenta anos, a cidade de Londrina resumia-se a um amontoado de ranchos. Na medida em que a mata fechada ia sendo destruída para dar lugar às imensas lavouras de café e lavoura branca eram encontradas matérias-primas que serviam de base alimentar para os peões que trabalhavam sem parar, bem como para imigrantes de várias nacionalidades (SCHWARTZ, 2005).

A adaptação dos grupos de estrangeiros como, italianos, alemães, japoneses, portugueses, árabes e nacionais como, paulistas, mineiros, baianos, cearenses e capixabas que migraram para o norte do Paraná ao meio geográfico desta região, fez com que surgissem diferentes modos de vida (depredatórios do ponto de vista da natureza), gerando riqueza e desenvolvimento (posteriormente), inclusive cultural.

Faz-se necessário ressaltar que o processo de ocupação de Londrina está intimamente ligado ao Estado de São Paulo na medida em que muitos desses grupos étnicos vieram desse Estado numa segunda tentativa de desbravar a terra e "fazer a América". Outros grupos de imigrantes vieram diretamente de seus países de origem. Nesse processo ocupacional os produtos da colheita, caça e pesca eram muito utilizados no suprimento alimentar.

Havia na região vários locais designados de “Armazém de Secos e Molhados”, sendo encontrados em documentos da época, propagandas que chamavam a atenção dos consumidores pela criatividade e promessa de melhores preços dos produtos. Como exemplo, podem ser citado:

“Armazem de Seccos e Molhados – Productos coloniaes em geral/ Tecidos e Armarinho, de propriedade de David Dequêch, e localizado na Avenida Paraná, 332 em Londrina”; “Casa Mercurio – Seccos e Molhados/ conservas, bebidas, ferragens. A Casa mais antiga na praça, de propriedade de Fr. Schultheiss, e localizado na Avenida Paraná, 387 em Londrina”; “Casa Azul – Seccos e Molhados/ louças, ferragens e armarinhos. De propriedade de Z. Iwarura, e localizado próximo a E. F. S. Paulo Paraná, em Rolândia (PARANÁ NORTE, 1935, 1936).

Os alimentos utilizados, o modo de consumo e suas técnicas de preparo resultaram da combinação entre os elementos citados acima, as possibilidades de produção do meio físico da região (com solo fértil e clima favorável) e a herança cultural das etnias que se mudaram para Londrina.

O palmito era um recurso abundante  encontrado na mata da região, sendo consumido de várias maneiras, a depender da imaginação das mulheres em criar receitas para o produto. Comia-se palmito assado, refogado, cozido em salmoura, in natura e mais raramente, como recheio de tortas, já que os carregamentos de farinha não supriam a demanda da época (SECRETARIA ESPECIAL DA MULHER, 1999; AYRES, 2005).

Muitas são as culinárias que transformaram Londrina num importante centro gastronômico do norte paranaense na atualidade. Em entrevista à primeira aluna do Colégio Mãe de Deus, Alice Brugin descreveu com uma impressionante riqueza de detalhes o cotidiano alimentar de sua família que apesar de ser italiana, saboreava os pratos brasileiros sem deixar de preparar as massas, o salame, os molhos e a carne de porco da maneira como eram feitos na terra natal.

 

Árabes e japoneses em Londrina: originalidade e adaptações na dieta cotidiana

 

O primeiro restaurante árabe de Londrina foi fundado no ano de 1965. Criado por uma família de origem libanesa, os hábitos eram seguidos à regra até que, para agradar por completo o gosto da clientela e de parte da família, foi adicionada ao cardápio a feijoada nas segundas-feiras e sábados, sendo servidos ocasionalmente feijão e arroz (IZAR, 2005).

A idéia inicial de inaugurar um restaurante de comida árabe em Londrina surgiu a partir de um almoço com amigos, que fizeram a recomendação. Apareceu assim o restaurante Kiberama (situado à Rua Mato Grosso, S/N), servindo inicialmente – e não inserindo receitas de outras etnias a não ser a árabe no cardápio – os seguintes pratos:

·                   Miúdos, tripas, bucho e tudo que pudesse ser consumido do carneiro;

·                   Lentilhas cozidas e temperadas;

·                   Arroz com carne de carneiro;

·                   Quibe cru;

·                   Grão de bico;

·                   Coalhada seca e fresca;

·                   Tabule;

·                   Charuto (preparado com folhas de parreira e recheado com arroz);

·                   Carne de cabrito (toda carne era frita e armazenada em banha do próprio animal);

·                   Esfirra;

·                   Sopas de frango;

·                   Saladas temperadas com muito azeite de oliva;

·                   Pão sírio;

·                   Pasta de berinjela.

A matéria-prima para a preparação desses pratos vinha na maioria das vezes de Cornélio Procópio, PR, e o azeite era sempre comprado no tradicional supermercado Shangrilá (IZAR, 2005). Além dos pratos citados, eram consumidos diversos doces típicos com essência de rosas e damasco (comprados também no supermercado Shangrilá). A principal bebida tomada ao longo do restaurante era o licor de anis.

A influência japonesa também é muito forte na formação dos hábitos alimentares de parte da população de Londrina. Em entrevista realizada em 24 de maio de 2006, o dono do mais antigo restaurante japonês da região de Londrina – Chinzoo Matsuo - expôs um pouco de sua trajetória migratória, relatando a história do restaurante e dos hábitos alimentares da colônia japonesa ao longo do processo de colonização.

Os pais trabalhavam na colônia Água Limpa, em São Simão. Em 1933 a família inteira mudou-se para Valparaíso, onde morou até 1936. O motivo principal da migração foi o surgimento da malária na colônia. Juntamente com mais seis parentes, mudou-se então para Londrina no ano de 1937, começando a trabalhar como fotógrafo – profissão em que atuou por vinte anos.

No ano de 1948 casou-se e a esposa teve a idéia de abrir um restaurante em 1954, localizado à Rua Minas Gerais – a construção ainda era muito rústica, toda de madeira, sendo que com o tempo iam reformando.

Servia-se no início apenas udom – um prato preparado com um tipo de macarrão grosso, feito de trigo – e com um ou dois anos de funcionamento do restaurante o cardápio foi sendo ampliado, sem no entanto, servir as iguarias que se conhecem nos restaurantes japoneses da atualidade.

No ano de 1960, quando a construção do restaurante foi finalizada por completo, precisou-se vender a casa juntamente com o restaurante que outrora foi construído como anexo. Anos mais tarde – uns três anos mais ou menos – a família mudou-se para onde o restaurante atual está localizado (Rua Belo Horizonte, 115). No ano de 1986 foi inaugurado o restaurante já neste último endereço.

A família era muito pequena e nenhuma das pessoas que vieram para Londrina trabalhou na lavoura.

As casas no início eram todas de madeira – como de costume – e a alimentação da colônia japonesa no geral era basicamente o arroz, feijão, alguma carne de vez em quando e cereais em geral.

Um senhor japonês que vinha sempre de São Paulo (não se lembra do nome) trazia alguns produtos típicos do Japão para serem comercializados aqui na região. Foi quando, por indicação desse japonês, foi apresentado um cozinheiro vindo de São Paulo para ajudar na cozinha do restaurante. Esse “novo” ajudante era chinês e inevitavelmente, a culinária chinesa foi se incorporando à japonesa, influenciando no cardápio até hoje.

Nas festas e comemorações da colônia era sempre servido “Teishoko” – prato em que é servido de tudo um pouco; sushi e sashimi.

Os pratos japoneses eram sempre preparados pela sua esposa; e os pratos chineses preparados pelo cozinheiro que veio de São Paulo. Comia-se muito também – especialmente aos fins de semana – conservas preparadas com pepinos, nabos entre outros legumes.

Por um período, o restaurante ficou sendo arrendado pelo cozinheiro “chinês” que preparava os pratos chineses, mas percebeu-se que não estava dando muito lucro e o negócio – com o fim do contrato – não foi renovado.

No início da colonização japonesa surgiram alguns restaurantes japoneses, mas nenhum “sobreviveu”.

Como bebidas servia-se basicamente o saquê – bebida alcoólica à base de arroz fermentado – mas com o tempo o hábito de tomar saquê foi desaparecendo. Após o restaurante ser “transferido” para o endereço atual a família não sofreu nenhuma crise. Na época da Guerra o material fotográfico ficou em falta porque era importado, mas com relação aos alimentos, nada faltou.


Considerações Finais

 

Desde sua fundação, Londrina foi colonizada por muitas etnias, fazendo com que os hábitos alimentares de seus habitantes, potencialmente, pudessem se tornar bastante diversificados. Sua cultura alimentar foi moldada inicialmente a partir dos recursos nativos disponíveis e plantados, bem como dos produtos vendidos em lojas de secos e molhados durante suas primeiras décadas de emancipação.

Na atualidade, a cidade conta com muitos restaurantes de pratos típicos de alguns países e Estados brasileiros, sendo que no presente projeto foi tratado especialmente a influência árabe e japonesa na evolução dos hábitos alimentares na região.

Enquanto no primeiro restaurante árabe de Londrina o cardápio pouco se modificou ao longo do tempo, os proprietários do primeiro restaurante japonês incrementaram em suas receitas, pratos da culinária chinesa.

Conservando as receitas originais ou adaptando novos pratos à culinária típica principal, percebe-se que os restaurantes investigados preservam um pouco da memória cultural da região norte do Paraná principalmente por possuir, ainda, aspectos inseparáveis da trajetória de construção da cidade de Londrina.

 

Referências

 

AGUIAR, P. de. Mandioca: pão do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982.

AYRES, João Dias. Entrevista [julho, 2005]. Entrevistadores: Fernanda Martins, Joviniano Netto, Márcia Carvalho. Entrevista concedida ao projeto Pés-Vermelhos da Universidade Estadual de Londrina.

BISOGNIN, Realda. Entrevista [maio, 2005]. Entrevistadores: Fernanda Martin, Joviniano Netto. Entrevista concedida ao projeto Pés-Vermelhos da Universidade Estadual de Londrina.

BRUGIN, Alice. Entrevista [junho, 2005]. Entrevistadores: Fernanda Martins, Joviniano Netto, Márcia Carvalho. Entrevista concedida ao projeto Pés-Vermelhos da Universidade Estadual de Londrina.

IZAR, Salime. Entrevista [setembro, 2005]. Entrevistadores: Joviniano Netto, Fernanda Martins, Márcia Carvalho. Entrevista concedida ao projeto A Geografia dos Alimentos no norte do Paraná: influências estrangeiras. Universidade Estadual de Londrina.

KHATOUNIAN, C. A. Produção de alimentos para consumo doméstico no Paraná: caracterização e culturas alternativas. Londrina: IAPAR, 1994.

MATSUO, Chinzoo. Entrevista [maio, 2006]. Entrevistador: Joviniano Netto. Entrevista concedida ao projeto A Geografia dos Alimentos no norte do Paraná: influências estrangeiras. Universidade Estadual de Londrina.

MONBEIG, P. Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. São Paulo: HUCITEC – POLIS. São Paulo, 1984.

ORNELLAS, Lieselotte Hoeschl. A alimentação através dos tempos. 3ª edição. Florianópolis: Ed. Da UFSC. Santa Catarina, 2003.

PARANÁ NORTE. Jornal. Anos de 1935 – 1936. microfilmes. Centro de Documentação e Pesquisa Histórica/ Universidade Estadual de Londrina.

SCHWARTZ, Widson. Entrevista [junho, 2005]. Entrevistadores: Fernanda Martins, Joviniano Netto, Márcia Carvalho. Entrevista concedida ao projeto Pés-Vermelhos da Universidade Estadual de Londrina.

SECRETARIA ESPECIAL DA MULHER – PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE LONDRINA. As diversas faces da mulher na produção alimentar. Londrina, 1999.

TEIXEIRA, E. F. O trigo no Sul do Brasil. São Paulo: Linotype. São Paulo, 1958.

A organização do espaço norte-paranaense: interfaces entre a Geografia da Saúde e a Geografia da Alimentação

RESUMO

 

O presente projeto de pesquisa busca conhecer as principais patologias e causa mortis de parte da população do município de Rolândia, PR, nas décadas de 1930 e 1940 e compará-las com as de Londrina, PR, bem como relacionar a Geografia da Saúde com a Geografia da Alimentação a partir dos hábitos alimentares e sua relação com as doenças que predominavam na época. Espera-se desta forma, espacializar os dados levantados e compreender os aspectos pertencentes à temática proposta ainda tão pouco explorada no norte do Paraná.

 

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

 

A distribuição espacial de eventos mórbidos relacionados a doenças endêmicas no Brasil ainda é pouco conhecida (XIMENEZ et al., 1999). Embora atualmente tenha crescido o número de pesquisas no campo da Geografia da Saúde que tratam da identificação e localização dessas patologias no território brasileiro, percebe-se que no norte-central paranaense – especialmente nos municípios de Londrina e Rolândia – há uma enorme carência de dados sistematizados que mostrem a espacialização dos fatores de risco a que a população dessa região se submetia nas décadas de 1930 e 1940, época em que a ocupação e expansão da fronteira agrícola ocorriam de maneira intensa.

Investigações geográficas que relacionam saúde/doença/morte de populações “pioneiras” são complexas e envolvem uma série de variáveis que devem ser consideradas na apreensão e contextualização da realidade em que a população de determinada área vivia (COSTA e TEIXEIRA, 1999), sendo assim, uma maneira de aproximar os dados disponíveis aos fatos historicamente verificados. Sugerida como um ramo da Geografia Humana, a Geografia da Saúde [antigamente conhecida como Geografia Médica] tem-se desenvolvido de forma dinâmica, prevalecendo e se preocupando, no entanto, com o conhecimento da distribuição e evolução de doenças sempre do ponto de vista geográfico (LACAZ, 1972). Contudo, percebe-se que nenhuma categoria de estudo isoladamente tem dado conta da pluralidade de fatores que expõem a relação acima, necessitando às vezes, o uso de outros campos de conhecimento, adotando-se eventualmente uma perspectiva interdisciplinar.

Por meio dos antecedentes teóricos mais notáveis e das produções desenvolvidas nas últimas décadas, a geografia da saúde tem-se, aos poucos, constituído uma sólida base epistemológica, merecendo destaque como ponto inicial, os trabalhos desenvolvidos por Max Sorre acerca dos conceitos de gênero de vida, ecúmeno e complexos patogênicos, bem como as interpretações das enfermidades e mortes que, com a aplicação dos conhecimentos geográficos, fundamentam a “geografia das doenças” na atualidade (ROJAS, 1998). Para entender a organização do espaço do norte do Paraná – ou de qualquer outra região – faz-se necessário conhecer a fundo as relações sociais da população, sendo que a análise e tratamento de dados podem permitir, mais que uma verificação de associações entre os fenômenos identificáveis, uma melhor contextualização em que foram produzidos os processos sócio-espaciais (SUSSER, 1994 apud BARCELLOS et al., 1998). Através da compreensão desses processos, pode ser traçada uma aproximação entre a Geografia da Saúde e a Geografia Alimentação, tendo como abordagem os aspectos que envolvem a valorização da dieta alimentar tanto do ponto de vista cultural como biológico.

À luz das investigações realizadas por Castro (2004), buscando as causas fundamentais da alimentação defeituosa de grande parte dos brasileiros, constatou-se que os processos que moldam o nível alimentar de uma população vão muito além de fatores de natureza geográfica [determinismo ambiental], devendo sempre ser entendidas como resultado de fatores socioculturais. Sabe-se que as condições oferecidas pela Companhia de Terras do Norte do Paraná (CTNP) e a construção da estrada de ferro em Londrina, num primeiro momento, contribuíram para que a região se tornasse destino de imigrantes de vários países, chegando ao final de 1938 inclusive, a possuir proprietários oriundos de trinta e duas nacionalidades (MELCHIOR, 2003).

Próximo ao norte-central paranaense, Monbeig (1984) à sua época, expõe a dieta do colono da fazenda da frente pioneira paulista, deixando evidentes as influências dos imigrantes de origem mediterrânea, dos colonos vindos da Europa central e dos japoneses; mostrando também, superficialmente, como esse “intercâmbio” cultural influenciou na composição da dieta alimentar cotidiana. Sabe-se que a ausência de infra-estruturas de saneamento básico na região de Londrina e a alimentação precária de grande parte de sua população ofereciam condições para o aparecimento de determinadas doenças (VILLANUEVAS, 1974). Verificar a influência dessa população que migrou para a unidade espacial de análise do presente projeto – Londrina e Rolândia – torna-se então um desafio a ser superado através da pesquisa proposta.

 

JUSTIFICATIVA

 

As referências escritas a respeito das doenças endêmicas e sua causa mortis no norte-central do Paraná, especialmente nos municípios de Londrina e Rolândia, bem como os aspectos culturais e biológicos da alimentação são escassas e evidenciam uma grande lacuna no que se refere ao histórico de desenvolvimento da região. É de grande importância o levantamento de dados específicos que mostrem como se deu a espacialização das patologias [Geografia da Saúde] e a distribuição dos restaurantes [Geografia da Alimentação] a partir da diversidade de paladares, levando em conta as influências das migrações; e de que forma pode-se contextualizar a produção agrícola dos primeiros agricultores que se estabeleceram (agricultura de subsistência) nesses municípios com as posteriores mudanças decorrentes da cultura cafeeira instalada na região.

Com os dados obtidos espera-se realizar a sistematização em forma de publicações (resumos e artigos) em periódicos e/ou eventos científicos. Assim, começar-se-á a reunião de material que pode ajudar a preencher o vazio bibliográfico existente sobre ambas as geografias tratadas nos municípios em estudo, sem a pretensão, no entanto, de esgotar essa temática ainda tão pouco explorada no norte do Paraná.

 

OBJETIVOS

 

Geral

 

  • Conhecer as principais patologias [endêmicas ou não] e causae mortis da população no município de Rolândia, PR, nas décadas de 1930 e 1940, comparando-as com as de Londrina, PR, bem como relacionar a Geografia da Saúde à Geografia da Alimentação a partir dos hábitos alimentares, e a agricultura de alimentos de subsistência, verificando sua organização espacial.

 

Específicos

 

  • Contextualizar as condições ambientais dos municípios em estudo às situações sociais e à época da expansão da frente pioneira;
  • Conhecer a causa mortis de parte da população que viveu no município de Rolândia nas décadas de 1930 e 1940;
  • Construir um banco de dados contendo informações sobre nome, origem, idade e causa mortis de parte da população de Rolândia nas mencionadas décadas;
  • Conhecer a evolução dos hábitos alimentares de uma parcela da população do norte do Paraná, especialmente sobre Londrina, associando-os aos dados obtidos sobre as condições sanitárias e de saúde;
  • Construir mapas, tabelas e gráficos que representem a espacialização dos fenômenos geográficos levantados; e
  • Sistematizar em forma de resumos e artigos científicos as informações obtidas.

 

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

 

  • Levantamento bibliográfico (livros, jornais, revistas etc.);
  • Análise e organização das informações obtidas no livro de inumações do cemitério de Rolândia, PR, referentes às décadas de 1930 e 1940 em banco de dados;
  • Comparação dos dados obtidos sobre Rolândia, com os dados disponíveis por pesquisas anteriores sobre Geografia da Saúde realizadas em Londrina;
  • Associação de algumas doenças eventualmente causadas por subalimentação e/ou condições sanitárias precárias;
  • Levantamento da diversidade e número de restaurantes existentes em Londrina na atualidade, através do Sindicato de Estabelecimentos, Bares e Restaurantes; e
  • Trabalho de gabinete (sistematização e produção bibliográfica).

 

CONTRIBUIÇÕES ESPERADAS

 

Elaboração de material bibliográfico.

 

LOCAL DE REALIZAÇÃO/ ÓRGÃOS ENVOLVIDOS

 

Universidade Estadual de Londrina – Centro de Ciências Exatas – Departamento de Geociências e Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (BÁSICA OU PRELIMINAR)

 

BARCELLOS, Christovam; COUTINHO, K.; PINA, M. de Fátima; MAGALHÃES, M. M. A. F.; PAOLA, J. C. M. D.; SANTOS, S. M.  Inter-relacionamento de dados ambientais e de saúde: análise de risco à saúde aplicada ao abastecimento de água no Rio de Janeiro utilizando Sistemas de Informações Geográficas. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 14(3), p. 597-605, jul-set, 1998.

CASTRO, Josué de.  Geografia da Fome: o dilema brasileiro: pão ou aço. 4ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. 318p.

COSTA, Maria da Conceição Nascimento.; TEIXEIRA, Maria da Glória Lima Cruz.  A concepção de “espaço” na investigação epidemiológica. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 15(2), p. 271-279, abr-jun, 1999.

LACAZ, Carlos da Silva.  Conceituação, atualidade e interesse do tema: súmula histórica. In: LACAZ, C. da S.; BARUZZI, R. G.; SIQUEIRA JÚNIOR, Waldomiro.  Introdução à Geografia Médica do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo – Editora Edgard Blücher Ltda., 1972.

MELCHIOR, Lirian.  Migrantes japoneses: um ciclo migratório – O caso de Londrina – PR. Dissertação de Mestrado, Presidente Prudente: Universidade Estadual Paulista, 2003.

MONBEIG, Pierre.  Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. São Paulo: Editora Polis Ltda., 1984.

ROJAS, Luisa Iñiguez.  Geografía y salud: temas y perspectivas en América Latina. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 14(4), p. 701-711, out-dez, 1998.

VILLANUEVA, Orion.  Rolândia: terra de pioneiros. Londrina: Gráfica Ipê. Paraná, 1974.

XIMENEZ, R. A. de A.; MARTELLI, C. M. T.; SOUZA, W. V. de.; LAPA, T. M.; ALBUQUERQUE, M. F. M. de.; ANDRADE, A. L. S. S. de.; MORAIS NETO, O. L. de.; SILVA, S. A. e.; LIMA, M. L. C. de.; PORTUGAL, J. L.  Vigilância de doenças endêmicas em áreas urbanas: a interface entre mapas de setores censitários e indicadores de morbidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 15(1), p. 53-61, jan-mar, 1999.