RESUMO
O presente projeto de pesquisa busca compreender como a
Educação Ambiental Crítica pode contribuir para a conservação de ambientes
naturais degradados. Para tanto, utiliza como estudo de caso uma unidade de
conservação de proteção integral localizada no município de Americana, estado
de São Paulo. Os trabalhos envolvem, além de visitas in loco ao Parque Natural Municipal da Gruta, a participação de
atores ligados à gestão pública dos recursos naturais e da população de
entorno. A proposta está alinhada a uma das recomendações feitas pelo Grupo de
Trabalho “Turismo e Meio Ambiente” do Fórum de Turismo e Desenvolvimento Local,
realizado na Câmara de Americana em novembro de 2015. Trata-se de um projeto
ambiental voluntário, sem financiamento de órgãos de fomento ou instituições
públicas e privadas.
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, a Educação Ambiental surgiu como uma
maneira de despertar e sensibilizar as pessoas para a necessidade de diminuir
e/ou evitar os problemas causados pelos atuais modelos de desenvolvimento
econômico que afetam direta ou indiretamente a qualidade de vida das populações
e o meio ambiente de maneira geral.
O crescente avanço da degradação da natureza causado pelo
uso rápido e indiscriminado dos recursos naturais tem mostrado que nem todos se
preocupam com o desenvolvimento sustentável e com a qualidade de vida das
gerações futuras.
No entanto, ao longo da história humana, muitas são as
reflexões que mostram preocupação e interesse em conservar a natureza, seja por
respeito, ou ainda, como um alerta para nossa dependência dos recursos
naturais. A exploração desenfreada dos recursos naturais interfere
drasticamente nos ciclos biológicos e influenciam a vida e o comportamento
humanos.
Guimarães (2004) enfatiza que a educação é um potencial
propulsor de dinâmicas do sistema social e um importante meio de luta que põe
em conflito as forças sociais que a sociedade deseja reproduzir, bem como as
coloca em conflito com as forças sociais que pretendem transformar a sociedade,
chamando a atenção para o fato de que a Educação Ambiental não deve ser
considerada algo fora da dinâmica social, correndo o risco de, neste caso,
provocar ações educativas não críticas da realidade, ainda que sejam bem
intencionadas, o que, por sua vez, podem resultar em posturas politicamente
conservadoras.
A reflexão crítica em Educação Ambiental tende a desvelar
realidades socioambientais estruturadas por relações de poder constitutivas de
relações entre indivíduos, sociedade e natureza, sendo que a compreensão da realidade
social e ambiental proporciona clareza para que ocorram ações críticas de
intervenção no processo social, considerando múltiplas determinações e gerando,
desta maneira, uma ruptura com os moldes paradigmáticos (GUIMARÃES, 2004).
Entretanto, a proposta crítica em Educação Ambiental ainda é
pouco conhecida e divulgada entre os profissionais que trabalham com educação ambiental.
Isto ocorre porque a Educação Ambiental crítica ainda não possui uma prática
visível consolidada como, por exemplo, acontece com a Educação Ambiental
conservadora. Para que a Educação Ambiental crítica se consolide como prática
efetivamente emancipatória e transformadora é necessário que os trabalhos na
área e as reflexões sejam interdisciplinares e levem em conta os diferentes conhecimentos
históricos, geográficos, biológicos, políticos e socioeconômicos, incentivando
a formação do cidadão crítico e capacitando-o a fazer reflexões e interferir em
seu mundo.
A formação de consciência ambientalista envolve a busca e
aquisição de conhecimentos de aspectos locais da ecologia, da cultura e da sociedade
por meio da práxis da Educação Ambiental. Desta forma é possível reformular
comportamentos e recriar valores perdidos ou ainda não alcançados. A
transformação de comportamentos pode possibilitar a conscientização de
populações sobre a necessidade de uma relação mais harmoniosa por parte de
todos com o meio ambiente, constituindo-se também numa exigência básica para o
alcance do desenvolvimento sustentável.
Atribuir sentidos à biodiversidade por meio do diálogo,
considerando os aspectos sociais e políticos na conservação e também, as
múltiplas abordagens que o conceito trata é papel da Educação Ambiental, pois
tais ações envolvem possibilidades educativas como, por exemplo, a
sensibilização e o encantamento estético (CARVALHO, 2006). Além disto, a
Educação Ambiental pode amalgamar o ser humano com a natureza e lhe conferir um
espécie de “maravilhamento” diante da biodiversidade e do meio ambiente.
De acordo com a definição dada na Conferência
Intergovernamental de Tbilisi realizada em 1977, a Educação Ambiental é um
processo de reconhecimento de valores e clarificações de conceitos, e tem como
objetivo o desenvolvimento das habilidades humanas, modificando as atitudes em
relação ao meio e buscando entender e apreciar as inter-relações entre os seres
humanos, suas distintas culturas e seus meios biofísicos (BRASIL, 2013). A
Educação Ambiental também está relacionada com a prática das tomadas de
decisões e a ética que conduzem para a melhora da qualidade de vida (BRASIL,
2013).
A Educação Ambiental foi definida no Congresso de Belgrado,
realizado em 1975 como um processo que busca formar população mundial
consciente e empenhada em resolver os problemas que dizem respeito ao meio
ambiente, estimulando a formação de população com conhecimentos, competências e
motivações para participar no engajamento que permita trabalhar individualmente
e coletivamente para solucionar tais problemas atuais e impedir que estes se
repitam (SEARA FILHO, 1987).
A Carta de Belgrado (1975) e as Orientações de Tbilisi
(1977) dispõem que há a necessidade de uma nova ética global capaz de promover
atitudes e comportamentos para os indivíduos e sociedades de acordo com o lugar
da humanidade na biosfera, e que reconheça e responda com sensibilidade às
dinâmicas e complexas relações do Homem com a natureza e entre os distintos
povos. As mudanças significativas necessitam ocorrer em todas as nações da
Terra para assegurar um tipo de desenvolvimento racional orientado por esta nova
ideia global (CARTA DE BELGRADO, 1975). A Carta de Belgrado é um dos mais
lúcidos documentos da década de 1970, pois além de tratar sobre a satisfação
das necessidades dos cidadãos do mundo, propõe que sejam resolvidas as causas
básicas da pobreza, da fome, do analfabetismo, da poluição, da exploração e
dominação, devendo ser tratados de maneira conjunta (DIAS, 2000).
Desta forma, cabe à Educação Ambiental fornecer os
conhecimentos necessários na interpretação dos fenômenos complexos que
configuram o meio ambiente, bem como fomentar valores éticos, econômicos e
estéticos que constituem a base da autodisciplina, e também favoreçam o
desenvolvimento de comportamentos que estejam de acordo com a preservação e a
melhoria do meio (UNESCO, 1997).
De acordo com a Declaração da Conferência das Nações Unidas
sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972, a melhoria e a
defesa do meio ambiente para as gerações presentes e futuras são objetivo comum
da humanidade. Porém, para que surtam efeito é necessário que se criem e adotem
novas estratégias com fins a este objetivo. A Educação Ambiental necessita
abarcar pessoas de todas as idades e níveis escolares tanto no âmbito do ensino
formal, como no ensino não-formal.
Os meios de comunicação social possuem grande
responsabilidade de disponibilizar recursos a serviço dessa missão educativa e
os especialistas em educação ambiental e meio ambiente devem produzir ações e
decisões que repercutam significativamente na natureza e no meio urbano.
Compreendida devidamente, a Educação Ambiental deve compor o ensino geral,
atuando nas mudanças que se produzem num mundo em constante e rápida evolução.
Há também a necessidade de possibilitar ao cidadão a compreensão dos principais
problemas contemporâneos em diversas escalas, adotando um enfoque global que
tenha como fundamento uma ampla base interdisciplinar. A educação contribui
para vincular os atos presentes com as consequências futuras e, além disto,
para demonstrar solidariedade entre o gênero humano, mostrando interdependência
entre as comunidades.
Na década de 1980, em especial em 1985, é criado pelo
governo brasileiro o Parecer 819/85 do Ministério da Educação (MEC), em que são
reforçadas as necessidades de inclusão de conteúdos ecológicos no processo de
formação do ensino de 1º e 2º graus, integrados em todas as áreas do
conhecimento de forma sistematizada e progressiva, com a finalidade de formar
consciência ecológica do futuro cidadão.
Em 1988 a Constituição da República Federativa do Brasil
dedica o capítulo VI ao Meio ambiente e o artigo 225, inciso VI, à Educação Ambiental,
determinando ao Poder Público que se promova a Educação Ambiental em todos os
níveis de ensino.
Na década de 1990, no ano de 1991, surge a Portaria 678/91
do MEC, determinando que a educação escolar deva contemplar a Educação Ambiental
permeando todo o currículo dos diferentes níveis de ensino, enfatizando a
necessidade de investir na capacitação de professores em tal área. Ainda neste
ano, surge a Portaria 2421/91 do MEC, em que é instituída o caráter permanente
de Grupos de Trabalhos de Educação Ambiental com o objetivo de definir junto às
Secretarias Estaduais de Educação, as metas e estratégias para a implantação da
Educação Ambiental no Brasil e elaborar propostas de atuação do MEC no ensino
formal e não-formal para a Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento que veio a acontecer no ano de 1992.
A Conferência da ONU sobre Meio ambiente e Desenvolvimento,
conhecida como Rio-92, promoveu um workshop com o objetivo de socializar os
resultados de experiências nacionais e internacionais de Educação Ambiental,
bem como discutir metodologias e currículos. Deste encontro surgiu a Carta
Brasileira para a Educação Ambiental.
Em 1996 é criada a Lei nº. 9.276/96 que estabelece o Plano
Plurianual do governo 1996/1999, definindo como principais objetivos do campo do
meio ambiente, a promoção da Educação Ambiental por meio da divulgação e uso de
conhecimentos sobre tecnologias de gesto sustentável dos recursos naturais,
sendo que a coordenação de Educação Ambiental promoveu alguns cursos de capacitação
de multiplicadores em Educação Ambiental.
Muitos foram os encontros e cursos de capacitação que
surgiram nos anos seguintes, sendo que em 1999 foi promulgada a Lei nº. 9.795
de 27 de abril de 1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental
com a criação de grupos de trabalho e câmara técnica temporária de Educação Ambiental
no Conselho Nacional de Meio Ambiente.
No que se refere ao município de Americana, SP, área da
presente pesquisa, é evidente a preocupação de incluir a Educação Ambiental
como processo de desenvolvimento da cidadania, bem como nas escolas municipais
mantidas pela Prefeitura nos ensinos fundamental e médio, conforme programas
que devem ser elaborados pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, por
professores e agentes que promovem o turismo em áreas naturais.
São variados os paradigmas de pesquisa em Educação Ambiental
e acredita-se que não seja possível ter um perfil ou uma “receita” pronta para
o pesquisador que lide com este tema complexo e não homogêneo. De acordo com
Sato e Santos (2003), as três principais vertentes e respectivas pesquisas em
Educação Ambiental são: a Vertente Positivista; a Vertente Construtivista; e a
Vertente Sócio-construtivista ou Vertente Crítica, detalhadas abaixo:
- A Vertente Positivista é fortemente marcada por pesquisas empíricas baseadas na observação. Possui natureza ecológica e tem ênfase na informação, estabelecendo relações hierárquicas de poder com o professor, que se situa no centro e os alunos na periferia. Baseia-se no objetivismo em que conhecimento é derivado, cumulativo e progressivo. A interação não é estimulada e a pesquisa visa a possibilitar generalizações. Os comportamentos são quantificados, sendo que o foco nas metodologias são os maiores instrumentos para validação desta vertente. No entanto, essa concepção implica em certas condições operacionais da escola, em que o professor que não domine a crítica necessária nos métodos empíricos das análises estatísticas não consegue testar a validade dos resultados obtidos com os objetivos que foram propostos.
- A Vertente Construtivista surgiu da crítica à vertente acima, mais especificamente da crítica aos paradigmas analíticos. Esta vertente é baseada na aceitação da realidade multifacetada ou na ontologia relativista. Ou seja, a realidade existe apenas no contexto do horizonte construído e é socialmente construída com múltiplos significados. O método da Vertente Construtivista revela apenas o que está implícito a priori; a construção individual é desenhada por meio da interpretação, sendo que somente após as comparações é possibilitado o conhecimento. Cabe destacar que nesta vertente não há clara intenção de transformar a leitura do mundo. Assim sendo, Robottom & Hart (1993 apud SATO; SANTOS, 2003) esclarece que limitando a construção do conhecimento e considerando apenas o contexto e a realidade individuais, esta vertente apresenta-se como somente um fim justificável para as questões educacionais, em vez de ser um processo de transformação da realidade.
- A terceira vertente trata da Teoria Crítica, nosso foco na presente pesquisa, que, por sua vez, é descrita como uma pesquisa ideologicamente orientada. Esta vertente busca desenvolver posturas analíticas com argumentos, procedimentos e linguagem com uma lente relacionada com as questões de poder. Se por um lado a vertente positivista tem um interesse apenas técnico-instrumental e os construtivistas um interesse prático-comunicativo, os que defendem a Teoria Crítica defendem a ação-constitutiva de emancipação. O conhecimento é generativo, emergente, dialético; e as pesquisas buscam a transformação das realidades como sujeitos no processo histórico de realidades multifacetadas (SATO; SANTOS, 2003).
O propósito da pesquisa da Teoria Crítica é a emancipação
dos atores sociais por meio das críticas das desigualdades (práxis para a
transformação); a natureza da realidade é múltipla, construída, divergente e
comprometida com questões ligadas com a igualdade; a natureza do conhecimento (epistemologia)
é marcada por fatos compreendidos num contexto econômico e social, com ênfase
nas posturas críticas e na práxis ideológicas; e a relação entre o pesquisador
e a descoberta está inter-relacionada e comprometida com a emancipação das
sociedades e/ou dos grupos sociais.
A Educação Ambiental Crítica, que se baseia na Teoria
Crítica supracitada, deve, assim, incentivar a formação do cidadão crítico e
capacitá-lo a fazer reflexões sobre seu mundo e a interferir no mesmo. De
acordo com Loureiro (2004) e Guimarães (2004), a tendência crítica em Educação
Ambiental caracteriza-se como transformadora e emancipatória e possui atitude
reflexiva frente aos desafios que a crise civilizatória atual nos põe, e parte
do princípio de que a maneira como vivemos não atende aos anseios de todos,
necessitando que sejam criados novos caminhos.
Este campo da Educação Ambiental pauta-se no entendimento
amplo da participação social e da cidadania como prática imprescindível para o
exercício da democracia. Assim, a democracia é condição para a construção da
sustentabilidade, item indispensável da Educação Ambiental Crítica. O desafio
da Educação Ambiental Crítica é, portanto, reestruturar as orientações e os
métodos que até então tem sido usados pela Educação Ambiental.
Para isto, é necessário considerar os pontos de vista de
grupos envolvidos, seja em escolas ou nos órgãos públicos ambientais, no
intuito de entender quais as representações sociais que norteiam, os objetivos
e as ações dos grupos diante das distintas realidades socioambientais e dos
problemas observados, indicando possíveis soluções.
Ao ser iniciada uma proposta de Educação Ambiental Crítica é
necessário levantar e entender diferentes percepções acerca dos problemas e do
meio ambiente, e considerar as representações sociais do grupo ou da sociedade,
levando em conta todas as visões e opiniões, ainda que pareçam equivocadas ou
divergentes. Além disto, tal proposta deve considerar as questões dos processos
sociais, a história, o contexto geográfico, econômico, político, as classes
sociais e as diferentes culturas (RUSCHEINSKY, 2012). Somente assim serão
estabelecidos os subsídios para que os atores envolvidos se situem como
cidadãos integrantes do grupo social. Imprescindível se faz também que a
pesquisa em Educação Ambiental Crítica e a equipe que lide com o tema sejam
interdisciplinares, ou seja, compostas por membros de diferentes áreas do
saber.
A ação coletiva, incluindo os atores sociais e as
instituições envolvidas, deve estimular que a educação ambiental seja realizada
tanto nas escolas como em outros espaços, sejam eles formais ou informais. Além
disto, a Educação Ambiental Crítica estimula incluir também os excluídos dos
processos de tomadas de decisão e indicar a realização de mudanças a favor dos
membros e da natureza.
A Educação Ambiental Crítica deve explicitar valores e
interesses ocultos de grupos e pessoas que estes adotem posições em relação aos
temas. O Tratado de Educação Ambiental, resultado da Jornada Internacional de
Educação Ambiental realizada na mesma época da Rio 92, estabelece dezesseis
princípios que ficaram conhecidos como “Princípios da Educação Para Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global”, enfatiza que a Educação Ambiental deve
ajudar no desenvolvimento de consciência ética sobre todas as formas de vida
que existem na Terra, devendo também ser respeitados os ciclos de vida e os
limites da natureza e da vida (RIO DE JANEIRO, 1992).
De acordo com Sauvé (1999), a teoria crítica se consolidou
nas décadas de 1980 e 1990 sob a luz do pensamento pós-moderno, passando a
enfatizar o envolvimento comunitário e as ações locais, o diálogo entre os
diferentes saberes, os aspectos sociais e culturais, bem como a possibilidade
de transformação da realidade. A Educação Ambiental Crítica, ao incentivar a
participação das pessoas nas discussões, pode envolver temas como ciência,
tecnologia, conservação da biodiversidade, sociedade e, mais que isto, pode
levar o cidadão a se posicionar de maneira crítica nas relações de produção e
consumo, levando-o a reivindicar serviços de saúde dignos, moradias adequadas,
saneamento básico, despoluição dos rios, e fazer com que alguns produtos que
não sejam social e ambientalmente responsáveis sejam inclusive boicotados. Ou
ainda, que o cidadão fotografe e crie documentos capazes de denunciar situações
irregulares. Por meio da vertente crítica em Educação Ambiental vislumbra-se
uma maneira eficaz de incentivar a formação do cidadão, capacitando-o a
refletir sobre seu mundo e a modificá-lo.
Segundo Freire (1996), a prática docente crítica envolve
movimento dinâmico e dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer. A práxis
é a reflexão-ação e ocorre simultaneamente. A ação de educar é política, ou
seja, a Educação Ambiental não deve se abster de posicionar-se diante das
questões e dos problemas sociais e ambientais; estas por sua vez, tem raiz no
sistema capitalista (FREIRE, 1996).
Loureiro (2004) propõe que a Educação Ambiental Crítica
possibilite realizar questionamentos às abordagens comportamentalistas, dualistas
e reducionistas no entendimento da relação cultura-natureza, enfatizando que
esta vertente da Educação Ambiental é um meio para que seja modificada a crise
socioambiental. A educação emancipatória exige que os conhecimentos sejam
construídos de forma coletiva e cooperativa, dialógicos, contínua e dinâmica
rumo à construção das sociedades mais sustentáveis.
Para Freire (1996), educar é um ato de conhecimento da
realidade concreta e que refletir, compreender, criticar e atuar constituem
ações pedagógicas desejáveis. Quando a aprendizagem acontece de maneira
dialógica e participativa possibilita mudanças significativas nas relações
sociais capazes de influenciar fortemente na conservação e preservação do meio
ambiente, da natureza ou do local onde são realizadas atividades humanas, como
por exemplo, o ecoturismo, os órgãos que compõem os Sistemas Municipais de Meio
Ambiente e as salas de aula. A educação que coloca como foco o lugar,
independentemente da escala, é capaz de propiciar experiência significativa e
promover a consciência ecológica.
DESCRIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
O Parque Natural Municipal da Gruta está localizado em
Americana, estado de São Paulo. Também conhecido como “Gruta Dainese” ou “Gruta
de São Roque”, constitui-se numa unidade de conservação de responsabilidade
municipal, representando atualmente, entretanto, um evidente exemplo da
ausência de gerenciamento e mau uso por parte da população local.
Em 2005, por meio do Decreto Legislativo n.º 275, foi
instituída uma comissão especial de estudos com vistas à preservação do Parque.
Dentro de suas atribuições, a comissão elaborou o Projeto de Lei nº 059/2005
que previa a constituição de uma comissão consultiva pelo Poder Executivo para
elaboração de um Plano Diretor para recuperação da Gruta Dainese.
Tal projeto de lei foi aprovado pela Câmara, sancionado e
promulgado pelo prefeito à época e transformado na Lei 4.195/2005. O Plano
Diretor considera a complexidade técnica, financeira e administrativa para o
gerenciamento da área do Parque e propõe a adoção de medidas estruturais e não
estruturais objetivando a recuperação da vegetação e fauna características do
bioma Mata Atlântica, a realização de estudos e pesquisas e o desenvolvimento
de Educação Ambiental e Ecoturismo com vistas ao lazer e interpretação
ecológica.
Diante das medidas apontadas pela comissão, em 2006 a área é
reconhecida como uma unidade de conservação pelo Decreto 6.980, posteriormente
alterado pelo Decreto 7.003. Assim, é nomeado como “Parque Natural Municipal da
Gruta”. De acordo com Gotardi (2009), a área do Parque é de 490.925 m². O Plano
Diretor do Parque Natural Municipal da Gruta é dividido em duas partes: a do
Parque propriamente dito e a da área de lazer do entorno onde está envolvido
seu ecossistema.
É uma unidade de conservação de proteção integral com beleza
cênica peculiar, dada sua topografia formada por diversas fendas,
estratificação de arenitos e uma pequena gruta. Maior parque urbano de
Americana, possui também setes quedas d’água, nascentes e remanescentes de mata
atlântica e de cerrado. No entanto, mesmo diante de sua relevância para
preservação ambiental e histórica percebe-se que as políticas públicas
existentes não têm se efetivado na prática (ORTOLANO; SILVA NETTO, 2016).
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC), criado pela Lei 9.985/2000, prevê no artigo 2º, inciso I, que as
unidades de conservação devem ter seus objetivos de conservação e limites
definidos sob regime especial de administração, com garantias adequadas de
proteção.
Balan (2015) aponta a relevância histórica do Parque Natural
Municipal da Gruta como atrativo turístico e espaço de lazer, bem como espaço
para recarga do manancial hídrico, auxiliando no controle de enchentes e
qualidade do ar na região. Aponta que não existe gerenciamento por parte do
Poder Público e são observados o despejo de esgotos sem tratamento, ocupações
irregulares, descuido e depredação por parte dos moradores do entorno (BALAN,
2015).
Os atuais usos do Parque retratam uma relação conflituosa
entre sociedade e meio ambiente. Com efeito, observa-se um descaso com relação
à área da gruta e, assim, um problema de saúde pública, haja vista a reprodução
de escorpiões venenosos, Aedes aegypti e
roedores, assim como a proximidade da
população aos locais sem saneamento básico. Nesse sentido, há um desafio
emergente para Americana que apresenta grave indicador de saneamento básico.
Atualmente, a cidade faz o tratamento de apenas 42% do seu esgoto (JORNAL O
LIBERAL, 2016).
O desenvolvimento local inclui a gestão dos recursos
naturais e a adequada administração das produções humanas, compreendendo uma relação
simbiótica entre a conjuntura social e o meio ambiente e suas transformações.
Diante do exposto, cabe mencionar que entre as propostas
sugeridas pelo Grupo de Trabalho de Meio Ambiente durante o Fórum de Turismo e
Desenvolvimento Local, ocorrido em novembro de 2015 na Câmara dos Vereadores de
Americana, destacam-se a realização de Educação Ambiental em áreas degradadas.
METODOLOGIA
Na presente pesquisa adota-se o estudo de caso
histórico-organizacional e observacional como metodologia. O estudo de caso é
recomendado para pesquisas intensivas do passado, do presente e das interações
ambientais socioeconômicas, geográficas, políticas e culturais de determinada
unidade, indivíduo, grupo, instituição ou comunidade escolhida por sua
especificidade (GRESSLER, 2003).
É caracterizada como uma pesquisa profunda que engloba a
totalidade dos ciclos de vida do objeto estudado e constitui-se, desta maneira,
num estudo interdisciplinar com visão holística. Ou seja, nesta forma de
investigação o caso não é fragmentado ou isolado em partes, pois todos os
elementos estão inter-relacionados (GRESSLER, 2003).
Baseia-se numa variedade de fontes de informação e procura
incorporar os diferentes pontos de vista presentes na situação. De acordo com
Kohn (1997), o estudo de caso como metodologia de pesquisa qualitativa surgiu
da necessidade de se conseguir modalidades mais adequadas para investigações
nas ciências sociais e humanas.
Para Stake (2000 apud GRESSLER, 2003), os estudos de caso
não são novos nem essencialmente qualitativos. Antes de se constituir numa
escolha metodológica é uma escolha do que deve ser pesquisado. O estudo de caso
pode ser qualitativo ou quantitativo, ou ainda, pode ser a combinação de ambos.
Independentemente do que se pretende adotar como paradigma,
o estudo de caso pode ser visto como uma importante tentativa de manter unidas
num sistema integrado as características importantes para a questão que vem sendo
estudada (GRESSLER, 2003).
Frequentemente o estudo de caso é utilizado em pesquisas
sobre novas áreas e assuntos sobre os quais ainda não existe teoria disponível,
bem como para descrever processos ou efeitos de um determinado evento ou de uma
intervenção para explicar um fenômeno complexo. Pode ainda ser utilizado para
testar hipóteses que exijam novos instrumentos de pesquisa.
No que se refere ao objeto da pesquisa, o estudo descritivo
se ocupa de grande número de elementos e estuda um número reduzido de
variáveis, enquanto o estudo de caso restringe o número de elementos em
investigação e se aprofunda no número de variáveis. A vantagem do estudo de
caso como recurso metodológico é a elevação da validade interna, dado o grande
número de variáveis e a profundidade de suas análises (GRESSLER, 2003).
Devido à restrição da amostra, o estudo de caso se torna um
estudo limitado quanto à representatividade e consequentemente quanto à
extrapolação dos resultados. Apresenta grande dependência da capacidade, sensibilidade
e preparo do pesquisador e se destaca por sua flexibilidade e possibilidade de
novas descobertas durante a pesquisa.
De acordo com Bodgan (apud TRIVIÑOS, 1987), há diversos
tipos de estudos de caso, a saber:
- Estudo de caso histórico-organizacional – Onde o interesse na pesquisa se volta, por exemplo, para a trajetória de uma instituição, clube, empresa etc. O investigador pode utilizar como fontes de pesquisa os materiais disponíveis como: atas de reuniões, publicações, livro de registro de funcionários dentre outros.
- Estudo de caso observacional - Os dados são coletados basicamente por meio de observações participantes. Tem como foco de estudo a unidade dentro da organização. Por exemplo: uma reunião do Comitê de Bacia Hidrográfica, uma aula de metodologia científica, um encontro com representantes do Poder Público, da sociedade civil organizada etc.
- Estudo de caso denominado história de vida – Este tipo de estudo é utilizado para estudar pessoas com peculiaridades positivas ou negativas, como por exemplo, deficiência mental, genialidade, habilidades artísticas, dentre outros. Nesta modalidade toma-se como base, geralmente, o uso de entrevistas abertas e/ou semi-estruturadas, em que as questões são aprofundadas durante o processo de entrevista.
- Estudo de caso – análise situacional – Nesta modalidade o estudo é focado em eventos específicos como, por exemplo, uma passeata pública em defesa da paz, protestos por aumentos de salários etc. Neste tipo de pesquisa o pesquisador busca conhecer as circunstâncias e os pontos de vista dos envolvidos.
São utilizados os seguintes procedimentos para o estudo de
caso, de acordo com recomendações de Gil (1996) e Gressler (2003):
- Identificação de pontos críticos;
- Delimitação do estudo: caracterização do objeto estudado, levantamento de relações externas e internas, políticas e demais atividades ligadas à temática do projeto;
- Estabelecimento do objetivo e/ou caracterização do problema;
- Verificação dos dados disponíveis, definição dos processos e instrumentos que serão usados na coleta de dados;
- Coleta de dados, levantamento dos indicadores ligados à prática de Educação Ambiental em relatórios e demais documentos existentes nos municípios, como as atas das reuniões do Conselho Municipal de Meio Ambiente;
- Organização das informações, analisando-as conjuntamente com especialistas, para a formação coerente e integrada da unidade em estudo;
- Relato dos resultados e discussão conjunta de sua significância com grupos de trabalho.
Os procedimentos e instrumentos a serem usados na pesquisa
englobam o levantamento bibliográfico em livros, periódicos, teses e
dissertações; reuniões e entrevistas sobre as práticas sociais e ambientais ligadas
à Educação Ambiental emancipatória com coordenadores pedagógicos do município;
levantamento documental (políticas, planos e programas); reuniões com gestores
e agentes ambientais, reuniões com Organizações Não Governamentais, englobando
também possíveis turistas e abordando o cerrado, a mata atlântica, os recursos
hídricos e o turismo na natureza, haja vista que o município de Americana
possui importantes unidades de conservação que necessitam de melhor
gerenciamento. Envolvem o contato com os membros do COMDEMA (Conselho Municipal
de Defesa do Meio Ambiente) de Americana e com diretores e professores das
escolas dos ensinos fundamental e médio, bem como a sistematização das
informações em banco de dados.
Será solicitada permissão para gravar as entrevistas e estas
serão transcritas, comparadas com o marco teórico e conceitual levantado na
pesquisa, bem como com a legislação que trata da Educação Ambiental e
conservação da natureza em outras esferas públicas (nacional e estadual),
analisadas de acordo com as seguintes categorias de análise:
- Participação da sociedade nos processos decisórios;
- Uso de instrumentos, indicadores ambientais e de sustentabilidade na gestão ambiental do município;
- Interação do órgão ambiental com outros órgãos do município e com órgãos ambientais do Estado e da União;
- Compatibilidade entre a teoria e leis existentes e a prática.
Os indicadores levantados serão analisados, sistematizados e
apresentados em eventos científicos locais, regionais, nacionais e
internacionais, cujos objetivos sejam estimular a discussão e a formação de
opinião sobre a práxis da Educação Ambiental, sobre o tema desenvolvimento
sustentável, bem como o papel do Município e sua relação no que se refere à
responsabilidade pelas questões socioambientais.
VIABILIDADE DE EXECUÇÃO
Para a execução desta pesquisa são necessários o acesso às
bibliotecas públicas, bem como aos bancos de dados e periódicos sobre o tema disponibilizados
via Internet pelo governo municipal, estadual e federal.
Vem sendo realizadas diversas visitas técnicas ao Parque
Natural Municipal da Gruta e demais Unidades de Conservação de Americana para a
realização de inventário fotográfico.
EQUIPE DE PESQUISADORES
Fábio Ortolano.
Joviniano Netto.
REFERÊNCIAS
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Foto-mosaico: Joviniano Pereira da Silva Netto (2016)