sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Breve reflexão sobre o desenho de joias contemporâneas

As joias contemporâneas - da mesma maneira que a arte de nosso tempo - vêm assumindo formas e características peculiares. Os materiais usados, especialmente com o advento da industrialização, se diversificaram. No design, em muitos casos, percebe-se ausência de critério estético. São peças desenhadas e confeccionadas para exibição momentânea, descompromissadas de propósito embelezador. Algumas parecem ter saído do “ferro-velho” diretamente para os corpos, modificando assim o próprio conceito de joia. Não desmerecendo a tendência, pois tudo na arte é válido como intenção criadora, considero o máximo da joalheria contemporânea joias valiosas que lembram bijuterias baratas e exigem algum esforço na identificação dos materiais. Peças de ouro banhadas em ródio negro ou oxidadas, com aspecto de ferrugem, são para apreciar.
Há 10 anos esbocei alguns desenhos de joia para uma amiga que queria reunir em poucas peças todas as gemas que ela tinha. Eram 300 pequenos rubis rosas, 300 minúsculos diamantes, uma morganita quadrada e uma enorme água-marinha azul esverdeada retangular com cerca de 70 quilates, lapidação esmeralda. Na ocasião, tive a ideia de criar dois broches que pudessem ser usados também como pingentes. Resolvemos que a morganita ficaria ladeada com os rubis e diamantes numa caixa de ouro rosa e a água-marinha, pela perfeita lapidação e raridade, numa discreta estrutura de platina sem nenhuma outra pedra. Com o passar do tempo perdi os desenhos e o contato com essa amiga, dona de um pensionato onde morei, mas as joias foram feitas com primor.
Poucas coisas são mais hipnotizantes do que gemas na lapidação esmeralda e diamantes em estojos de veludo. Detalhes de uma de joia são fundamentais para quem aprecia. Se o que se quer é qualidade, deve-se entregar a tarefa a um ourives experiente. Pelo brilho e pelas cores, as pedras preciosas que mais admiro são as do grupo do berilo. Após um curso de desenho de joias que fiz no SENAC, ministrado pelos talentosos professores Alain Monteiro e Dalva Ferrari, em que era preciso desenvolver um portfólio ao final, recomendei ao meu primeiro cliente, que todas as peças fossem feitas em platina, ouro branco ou prata se o propósito for seguir à risca meu projeto autoral. O foco que me interessa no universo da joalheria é sempre a gema. A função do metal, neste caso, é compor a estrutura da peça que, às vezes, é única.
Quando mulher (ou homem, por que não?) usa uma joia de maneira elegante tem-se a harmonia perfeita. Elegância é muito mais postura e comportamento do que exibicionismo. Nada contra a atitude de quem coloca um objeto precioso no corpo e faz questão de mostrar o tempo todo. Isso chega a ser engraçado. Elegância está associada à simplicidade, último grau de sofisticação nas palavras de Leonardo Da Vinci.
Uma joia, mesmo sendo de época, deve ser atemporal e simultaneamente marcar um estilo. Deve ser feita para durar. Não apenas levar em conta modismos de passarela, do mundo fashion e fotográfico. Extravagante ou discreta, delicada ou grosseira, com ou sem gemas, necessita ter identidade para acrescentar algo e marcar presença. Independentemente do preço, este é o verdadeiro poder de uma joia: encantar!
Pesquisei centenas de desenhistas e joalheiros ao longo daqueles meses de curso. Alguns estão listados na barra direita deste blog. Com exceção de clássicos da pintura que retrataram joias em suas naturezas-mortas, como Brueghel e Evert Collier, pintores que admiro num contexto mais amplo, a maior referência que conheço no design de joias é o francês René Lalique (1860-1945). No design contemporâneo, também verificando algumas semelhanças nas formas com os trabalhos de Lalique, merece destaque a produção do brasileiro Fernando Jorge e da inglesa Hollie Bonneville Barden, ambos radicados em Londres. Estes têm produzido verdadeiros feitos no universo do design da joalheria artística contemporânea.
Arte em destaque: “Poppy”, 1897 – René Lalique. © Musée d'Orsay.