terça-feira, 24 de outubro de 2023

A organização do espaço norte-paranaense: interfaces entre a Geografia da Saúde e a Geografia da Alimentação

RESUMO

 

O presente projeto de pesquisa busca conhecer as principais patologias e causa mortis de parte da população do município de Rolândia, PR, nas décadas de 1930 e 1940 e compará-las com as de Londrina, PR, bem como relacionar a Geografia da Saúde com a Geografia da Alimentação a partir dos hábitos alimentares e sua relação com as doenças que predominavam na época. Espera-se desta forma, espacializar os dados levantados e compreender os aspectos pertencentes à temática proposta ainda tão pouco explorada no norte do Paraná.

 

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

 

A distribuição espacial de eventos mórbidos relacionados a doenças endêmicas no Brasil ainda é pouco conhecida (XIMENEZ et al., 1999). Embora atualmente tenha crescido o número de pesquisas no campo da Geografia da Saúde que tratam da identificação e localização dessas patologias no território brasileiro, percebe-se que no norte-central paranaense – especialmente nos municípios de Londrina e Rolândia – há uma enorme carência de dados sistematizados que mostrem a espacialização dos fatores de risco a que a população dessa região se submetia nas décadas de 1930 e 1940, época em que a ocupação e expansão da fronteira agrícola ocorriam de maneira intensa.

Investigações geográficas que relacionam saúde/doença/morte de populações “pioneiras” são complexas e envolvem uma série de variáveis que devem ser consideradas na apreensão e contextualização da realidade em que a população de determinada área vivia (COSTA e TEIXEIRA, 1999), sendo assim, uma maneira de aproximar os dados disponíveis aos fatos historicamente verificados. Sugerida como um ramo da Geografia Humana, a Geografia da Saúde [antigamente conhecida como Geografia Médica] tem-se desenvolvido de forma dinâmica, prevalecendo e se preocupando, no entanto, com o conhecimento da distribuição e evolução de doenças sempre do ponto de vista geográfico (LACAZ, 1972). Contudo, percebe-se que nenhuma categoria de estudo isoladamente tem dado conta da pluralidade de fatores que expõem a relação acima, necessitando às vezes, o uso de outros campos de conhecimento, adotando-se eventualmente uma perspectiva interdisciplinar.

Por meio dos antecedentes teóricos mais notáveis e das produções desenvolvidas nas últimas décadas, a geografia da saúde tem-se, aos poucos, constituído uma sólida base epistemológica, merecendo destaque como ponto inicial, os trabalhos desenvolvidos por Max Sorre acerca dos conceitos de gênero de vida, ecúmeno e complexos patogênicos, bem como as interpretações das enfermidades e mortes que, com a aplicação dos conhecimentos geográficos, fundamentam a “geografia das doenças” na atualidade (ROJAS, 1998). Para entender a organização do espaço do norte do Paraná – ou de qualquer outra região – faz-se necessário conhecer a fundo as relações sociais da população, sendo que a análise e tratamento de dados podem permitir, mais que uma verificação de associações entre os fenômenos identificáveis, uma melhor contextualização em que foram produzidos os processos sócio-espaciais (SUSSER, 1994 apud BARCELLOS et al., 1998). Através da compreensão desses processos, pode ser traçada uma aproximação entre a Geografia da Saúde e a Geografia Alimentação, tendo como abordagem os aspectos que envolvem a valorização da dieta alimentar tanto do ponto de vista cultural como biológico.

À luz das investigações realizadas por Castro (2004), buscando as causas fundamentais da alimentação defeituosa de grande parte dos brasileiros, constatou-se que os processos que moldam o nível alimentar de uma população vão muito além de fatores de natureza geográfica [determinismo ambiental], devendo sempre ser entendidas como resultado de fatores socioculturais. Sabe-se que as condições oferecidas pela Companhia de Terras do Norte do Paraná (CTNP) e a construção da estrada de ferro em Londrina, num primeiro momento, contribuíram para que a região se tornasse destino de imigrantes de vários países, chegando ao final de 1938 inclusive, a possuir proprietários oriundos de trinta e duas nacionalidades (MELCHIOR, 2003).

Próximo ao norte-central paranaense, Monbeig (1984) à sua época, expõe a dieta do colono da fazenda da frente pioneira paulista, deixando evidentes as influências dos imigrantes de origem mediterrânea, dos colonos vindos da Europa central e dos japoneses; mostrando também, superficialmente, como esse “intercâmbio” cultural influenciou na composição da dieta alimentar cotidiana. Sabe-se que a ausência de infra-estruturas de saneamento básico na região de Londrina e a alimentação precária de grande parte de sua população ofereciam condições para o aparecimento de determinadas doenças (VILLANUEVAS, 1974). Verificar a influência dessa população que migrou para a unidade espacial de análise do presente projeto – Londrina e Rolândia – torna-se então um desafio a ser superado através da pesquisa proposta.

 

JUSTIFICATIVA

 

As referências escritas a respeito das doenças endêmicas e sua causa mortis no norte-central do Paraná, especialmente nos municípios de Londrina e Rolândia, bem como os aspectos culturais e biológicos da alimentação são escassas e evidenciam uma grande lacuna no que se refere ao histórico de desenvolvimento da região. É de grande importância o levantamento de dados específicos que mostrem como se deu a espacialização das patologias [Geografia da Saúde] e a distribuição dos restaurantes [Geografia da Alimentação] a partir da diversidade de paladares, levando em conta as influências das migrações; e de que forma pode-se contextualizar a produção agrícola dos primeiros agricultores que se estabeleceram (agricultura de subsistência) nesses municípios com as posteriores mudanças decorrentes da cultura cafeeira instalada na região.

Com os dados obtidos espera-se realizar a sistematização em forma de publicações (resumos e artigos) em periódicos e/ou eventos científicos. Assim, começar-se-á a reunião de material que pode ajudar a preencher o vazio bibliográfico existente sobre ambas as geografias tratadas nos municípios em estudo, sem a pretensão, no entanto, de esgotar essa temática ainda tão pouco explorada no norte do Paraná.

 

OBJETIVOS

 

Geral

 

  • Conhecer as principais patologias [endêmicas ou não] e causae mortis da população no município de Rolândia, PR, nas décadas de 1930 e 1940, comparando-as com as de Londrina, PR, bem como relacionar a Geografia da Saúde à Geografia da Alimentação a partir dos hábitos alimentares, e a agricultura de alimentos de subsistência, verificando sua organização espacial.

 

Específicos

 

  • Contextualizar as condições ambientais dos municípios em estudo às situações sociais e à época da expansão da frente pioneira;
  • Conhecer a causa mortis de parte da população que viveu no município de Rolândia nas décadas de 1930 e 1940;
  • Construir um banco de dados contendo informações sobre nome, origem, idade e causa mortis de parte da população de Rolândia nas mencionadas décadas;
  • Conhecer a evolução dos hábitos alimentares de uma parcela da população do norte do Paraná, especialmente sobre Londrina, associando-os aos dados obtidos sobre as condições sanitárias e de saúde;
  • Construir mapas, tabelas e gráficos que representem a espacialização dos fenômenos geográficos levantados; e
  • Sistematizar em forma de resumos e artigos científicos as informações obtidas.

 

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

 

  • Levantamento bibliográfico (livros, jornais, revistas etc.);
  • Análise e organização das informações obtidas no livro de inumações do cemitério de Rolândia, PR, referentes às décadas de 1930 e 1940 em banco de dados;
  • Comparação dos dados obtidos sobre Rolândia, com os dados disponíveis por pesquisas anteriores sobre Geografia da Saúde realizadas em Londrina;
  • Associação de algumas doenças eventualmente causadas por subalimentação e/ou condições sanitárias precárias;
  • Levantamento da diversidade e número de restaurantes existentes em Londrina na atualidade, através do Sindicato de Estabelecimentos, Bares e Restaurantes; e
  • Trabalho de gabinete (sistematização e produção bibliográfica).

 

CONTRIBUIÇÕES ESPERADAS

 

Elaboração de material bibliográfico.

 

LOCAL DE REALIZAÇÃO/ ÓRGÃOS ENVOLVIDOS

 

Universidade Estadual de Londrina – Centro de Ciências Exatas – Departamento de Geociências e Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (BÁSICA OU PRELIMINAR)

 

BARCELLOS, Christovam; COUTINHO, K.; PINA, M. de Fátima; MAGALHÃES, M. M. A. F.; PAOLA, J. C. M. D.; SANTOS, S. M.  Inter-relacionamento de dados ambientais e de saúde: análise de risco à saúde aplicada ao abastecimento de água no Rio de Janeiro utilizando Sistemas de Informações Geográficas. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 14(3), p. 597-605, jul-set, 1998.

CASTRO, Josué de.  Geografia da Fome: o dilema brasileiro: pão ou aço. 4ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. 318p.

COSTA, Maria da Conceição Nascimento.; TEIXEIRA, Maria da Glória Lima Cruz.  A concepção de “espaço” na investigação epidemiológica. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 15(2), p. 271-279, abr-jun, 1999.

LACAZ, Carlos da Silva.  Conceituação, atualidade e interesse do tema: súmula histórica. In: LACAZ, C. da S.; BARUZZI, R. G.; SIQUEIRA JÚNIOR, Waldomiro.  Introdução à Geografia Médica do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo – Editora Edgard Blücher Ltda., 1972.

MELCHIOR, Lirian.  Migrantes japoneses: um ciclo migratório – O caso de Londrina – PR. Dissertação de Mestrado, Presidente Prudente: Universidade Estadual Paulista, 2003.

MONBEIG, Pierre.  Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. São Paulo: Editora Polis Ltda., 1984.

ROJAS, Luisa Iñiguez.  Geografía y salud: temas y perspectivas en América Latina. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 14(4), p. 701-711, out-dez, 1998.

VILLANUEVA, Orion.  Rolândia: terra de pioneiros. Londrina: Gráfica Ipê. Paraná, 1974.

XIMENEZ, R. A. de A.; MARTELLI, C. M. T.; SOUZA, W. V. de.; LAPA, T. M.; ALBUQUERQUE, M. F. M. de.; ANDRADE, A. L. S. S. de.; MORAIS NETO, O. L. de.; SILVA, S. A. e.; LIMA, M. L. C. de.; PORTUGAL, J. L.  Vigilância de doenças endêmicas em áreas urbanas: a interface entre mapas de setores censitários e indicadores de morbidade. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, n. 15(1), p. 53-61, jan-mar, 1999.